3 de nov. de 2008


Ao crescer, a palavra "Yakuza" nunca era pronunciada na casa palaciana em que morava com os pais, o irmão e duas irmãs na cidade de Sakai, em Osaka. O conforto era correspondente ao cargo do pai na organização: a casa tinha cinco quartos e era protegida por portões de ferro e um fosso. Tinha piscina e uma garagem "que parecia um showroom" com a coleção de carros de seu pai. Nos fins de semana, a família jantava no restaurante favorito. "Essas ocasiões me faziam sentir que éramos normais mesmo que minha mãe usasse jóias caras e a carteira de crocodilo de meu pai fosse inchada como se tivesse acabado de engolir uma presa grande."

Mas outros eventos lembravam que sua vida não era normal. "Os vizinhos não deixavam os filhos brincarem comigo. Eu não tinha amigos e era desprezada na escola." Havia, ainda, o temperamento explosivo do pai, especialmente quando bebia. "Trocávamos televisores todo mês porque ele quebrava todos." O pai também tinha várias amantes -garçonetes que iam com ele para casa depois de uma noite de bebida farta. Ela ficava furiosa ao ver a mãe, uma defensora da etiqueta japonesa, servir bebidas para as mulheres do marido.

"No Japão, é impossível esconder seu passado. eu tenho o sangue da yakuza em mim"

Satomi, a mãe que ela adorava, morreu em 1991, aos 59 anos. Como as esposas e mães da Yakuza, Satomi estava sempre arrumada e fazia trabalhos de escritório para a empresa do marido -único papel permitido a uma mulher. "As mulheres da Yakuza devem agir como um cartão de visitas para os homens. E minha mãe era típica." Mas a mãe não fazia idéia de que Hiroyasu pertencia ao mundo do crime quando se casou: pensava que fosse um empresário. "Quando, depois de casada, percebeu quem era ele, deve ter ficado furiosa, mas viu que não era aconselhável criar problemas." Regularmente, as mulheres da organização se reuniam para um chá e compartilhavam reclamações. "Diziam que odiavam o modo como os maridos baixavam as calças na frente dos parceiros de negócios para mostrar o pênis tatuado ou como discutiam displicentemente sobre a dificuldade para tirar resíduos de pólvora de suas camisas."

Detalhe da tatuagem de Tendo que ocupa seu corpo inteiro

Aos 16 anos, cansada de ser rejeitada na escola, Shoko largou tudo para se unir a uma gangue. "O que tinha a perder? A sociedade não me aceitava mesmo." Mas, logo depois, as empresas de imóveis e construção do pai faliram. Os credores do mundo do crime se apossaram da casa e atiraram a família na rua. Sem a proteção paterna, ela foi vítima de uma série de bandidos da Yakuza, atraídos por seu corpo jovem. Um dos credores do pai, Maejima, a apresentou às anfetaminas e fez chantagem para que ela se tornasse sua amante. "Ele deixou claro que prejudicaria meu pai se eu não dormisse com ele", diz. Ficou viciada em drogas e passou os três anos seguintes escondida em motéis sujos, com luminosos de néon, cujos quartos são alugados por hora, esperando que Maejima trouxesse as doses.

Começou, então, a se relacionar com outros homens da Yakuza. "Quando não estava fazendo sexo ou consumindo drogas, eu os ouvia se gabar sobre quem tinham machucado naquele dia", conta. E, claro, também eram violentos com ela. "Diziam que eu os estava traindo e me espancavam." Depois de uma dessas surras, seu rosto ficou tão machucado que precisou de cirurgia plástica para apagar as cicatrizes e reconstruir o nariz.

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