3 de nov. de 2008

A voz feminina da Máfia Japonesa. ò.ó

Filha de um chefão da máfia japonesa, Shoko Tendo foi a primeira mulher a quebrar o código de silêncio da organização. Autora de um best-seller sobre sua degradante experiência no submundo do crime, ela fala sobre os amantes violentos e a dependência de sexo e drogas.

Shoko Tendo passeia de táxi pelas ruas de Tóquio e exibe o braço tatuado: marcas na pele de uma vida dentro da máfia

O Café Paris, em Tóquio, está lotado de jovens elegantes. Shoko Tendo fuma calmamente um cigarro mentolado. Ela sabe que poderia estragar o clima apenas arregaçando as mangas. Quase todos os centímetros do seu corpo estão cobertos pelas tatuagens que são marca registrada de uma facção criminosa japonesa, a Yakuza. Mas ela toma cuidado para não revelar de onde vem. Apesar do calor sufocante, usa uma camisa lilás de mangas compridas. Por dentro, veste um tipo diferente de rebeldia. Deixou para trás a vida no crime e tornou-se uma celebridade no Japão -a primeira mulher a romper o código de silêncio da máfia local.

Eu esperava que ela, aos 39 anos, intimidasse ou fosse agressiva. Mas Shoko Tendo se expressa com muita tranqüilidade. Seu livro de memórias, o best-seller "Yakuza Moon: Memoirs of a Gangster's Daughter" ("Lua da Yakuza: Memórias de uma Filha de Gângster"), ainda sem previsão de lançamento no Brasil, chocou o Japão quando foi lançado, em 2004: relato frio da dependência a sexo, drogas e amantes violentos, e a trajetória como filha de um dos chefões da Yakuza, o poderoso Hiroyasu.

"Vi um homem sangrando na porta: ele tinha cortado um dedo da mão para dar de presente a meu pai"

Pergunto como continua viva depois de escrever o livro; no mundo da máfia, qualquer traição é sentença de morte. E a Yakuza é um bando especialmente machista, conhecido por rituais como cortar os próprios dedos para se desculpar por erros. "Estava nervosa com as conseqüências", diz. "Mas acho que escapei porque não incriminei ninguém." Ela recebe telefonemas ameaçadores, mas afirma que não se arrepende. "Precisava fazer isso para descobrir qual o meu lugar no mundo", diz. Ela explica que as mulheres da Yakuza, embora raramente se envolvam em atividades criminosas, são difamadas por associação. "No Japão, é impossível esconder seu passado ou de onde vem. Percebi que a única maneira de mudar minha vida seria sendo honesta sobre o que vivi."

Shoko Tendo nas ruas de Tóquio

Noto que ela usa um relógio Hermès incrustado de brilhantes, mas carrega uma grande e surrada bolsa de lona a tiracolo, uma mistura que, afinal, revela seu tipo. O cabelo é bem cortado e a maquiagem, aplicada com cuidado. Mas tudo fica escondido debaixo de um boné de beisebol. "Não quero mais o mundo da Yakuza, só não estou pronta para entrar na sociedade. Ainda acho difícil confiar nas pessoas."

A Yakuza, que já existia desde o século 17, ganhou força durante a ocupação americana no Japão do pós-guerra e é hoje uma das maiores organizações criminosas do mundo, com um quadro de "sócios" que beira os 100 mil (leia quadro). "Odeio a Yakuza. Vi tudo de ruim que eles fazem. Mas amava meu pai, quaisquer que fossem seus crimes. Ele me criou e eu tenho seu sangue, o da Yakuza", diz. O contato com a realidade veio cedo, aos seis anos. Um dia, a pequena Tendo abriu a porta de casa e viu ali um bandido sangrando e esperando para falar com o pai. Ele segurava uma caixa que continha um "presente": um dedo da própria mão, que acabara de cortar. "O homem era um subalterno de meu pai que tinha feito uma coisa errada", explica. "Meu pai começou a bater nele. Não pude acreditar que ele ainda estivesse bravo com o homem, apesar de ele ter cortado o próprio dedo para pedir desculpas." Ela se escondeu atrás da mãe, mas já tinha visto o suficiente.

Um comentário:

Anônimo disse...

Olá. :]